Tema 9. A Escola de Aplicação da Feusp - a universidade e a rede de ensino



Nivia Gordo



Para José Mário Pires Azanha, uma escola de aplicação não pode e não deve ser diferente das escolas públicas, pois isto constituiria um desvirtuamento de sua real finalidade.

Não obstante a clareza desta idéia, o risco de estabelecimento de um estatuto privilegiado é permanente numa escola pública de aplicação; a história recente do ensino público paulista está cheia de exemplos de escolas que, pelos privilégios acumulados, desviaram-se do papel que lhes cabia em face da rede pública. Mas, uma escola de aplicação deve, quase paradoxalmente, ser exemplar. Exemplar como indicação da viabilidade de ensino público eficiente sem condições privilegiadas. Principalmente nestes tempos, em que a “má qualidade do ensino público” é a principal razão, ideologicamente manipulada para legitimar o descaso governamental com a escola pública, ganha relevo, até mesmo político, o esforço de demonstração da viabilidade pedagógica de uma boa escola pública (1).

Imbuído desta concepção, Azanha aceitou, em 1976, o cargo de representante da Escola de Aplicação junto à Feusp porque viu neste trabalho a possibilidade de concretizar dois importantes objetivos:
* dar à Escola de Aplicação um formato que a tornasse exemplar para as escolas da rede de ensino público;
* por em prática a responsabilidade da Faculdade de Educação no processo de melhoria da escola pública.

Com base nestes objetivos, Azanha, distante do movimento de renovação pedagógica na época, definiu uma diretriz para a EA a que deu o nome de Orientação Geral. Este documento é iniciado com uma crítica severa às idéias dessa renovação e propõe como objetivo da EA “a trivial transmissão de conhecimentos” como condição para a formação de homens capazes de criticar a si mesmos e à sociedade em que vivem. Com o mesmo empenho na crítica às idéias da Escola Nova, Azanha escreveu, entre outros textos, o prefácio “Alain ou a pedagogia da dificuldade” no livro deste autor, deixando clara a inocuidade de certas atividades como “ensino da criatividade”, “ensino recreativo”, entre outras.

Nos documentos propostos para estudo, o leitor tomará conhecimento, também, do projeto de ensino médio elaborado por Azanha e que foi posto em prática na EA a partir de 1985. Este projeto foi considerado exemplar pelo Conselho Estadual de Educação deste Estado que sugeriu sua implantação na rede de ensino médio.

Azanha salientou-se no panorama educacional deste Estado como um grande batalhador em prol da melhoria da escola pública. Neste sentido, deixou clara, entre outras medidas, a necessidade de preservar a autonomia da escola, vinculada à inteira liberdade das equipes escolares para a formulação de sua proposta pedagógica com base nos problemas reais da instituição e num esforço coletivo e contínuo para sua solução. Portanto, esta proposição implica rejeição a intervenções externas de órgãos técnicos e administrativos mediante envio de “pacotes” de orientação metodológica, ou outros documentos prescritivos. Para Azanha, é preciso preservar a liberdade de cada escola para que ela, com base na sua proposta pedagógica, concretize o objetivo de melhoria do ensino. A defesa desse caráter autônomo das instituições escolares inclui, também, a Escola de Aplicação, seja em relação a órgãos superiores externos da rede de ensino, seja no que se refere à própria Faculdade de Educação a que esta escola está vinculada. O que não exclui, evidentemente, o necessário entrosamento entre estas duas instituições, especialmente no que se refere a estágios dos alunos, estudos e pesquisas.

No segundo semestre de 1984, a Escola de Aplicação correu o risco de ser extinta, uma vez que o Reitor da USP questionou em ofício enviado ao Diretor da Feusp a validade de ser mantida uma escola 1º grau na Universidade. Diante deste fato, o Diretor da Faculdade realizou uma série de reuniões com a Congregação para discutir tanto a continuidade do Ensino Fundamental, quanto a implantação do Ensino Médio, pleiteado por pais e professores da EA. O Diretor da Feusp esclareceu que o motivo das reuniões decorria, entre outros fatores, de divergências de ponto de vista quanto ao relacionamento da EA com a Faculdade. Na verdade, essas divergências referiam-se, em grande parte, a desentendimentos havidos entre Nélio Parra e José Mário Pires Azanha, conforme o leitor poderá verificar nas cartas trocadas entre estes dois professores.

Diante deste fato, aliado a outros questionamentos sobre o relacionamento da EA com a Faculdade, Azanha propôs um debate sobre a EA. Para isto, pediu demissão do seu cargo e expôs suas expectativas, adiantando que se elas fossem frustradas, também seria frustrado o próprio debate “transformando-o em mera tertúlia acadêmica”. Essas expectativas são apresentadas nos documentos “A propósito de um debate sobre a Escola de Aplicação” e “A polêmica sobre o sentido de uma escola de aplicação”.

Azanha enfatizou a importância de críticas bem fundamentadas no debate e salientou a responsabilidade do pessoal da Faculdade no sentido de explicitar as alegadas insatisfações, expressas esparsamente e, por vezes, inoportunas por alguns de seus membros. E concluiu:
"Esta é a razão principal que torna este debate um acontecimento insólito. A FE, de fato, sempre foi ambígua na sua responsabilidade para com a Escola de Aplicação. Ambiguidade, no caso, pode eventualmente ser indicação de inconsequência intelectual e de irresponsabilidade acadêmica. Este debate é o momento para que a FE assuma o seu papel acadêmico e desfaça esta suspeita"(2).

Nos documentos relativos a atos legais e relatórios administrativos, o leitor tomará conhecimento das diversas disposições relativas à Escola de Aplicação: regimento, relatório de atividades e termos de Cooperação Técnica firmada entre a Secretaria de Estado da Educação e a Universidade de São Paulo que deixam claro o compromisso da Faculdade de Educação com a melhoria da escola pública deste Estado.

O conjunto dos textos apresentados neste arquivo mostra uma série de temas instigantes para a formulação de projetos de pesquisas, estudos, monografias, trabalhos de conclusão de cursos, seminários, entre outras atividades.


(1) AZANHA, J. M. P. Educação: alguns escritos. São Paulo: Ed. Nacional, 1987. p. 169.
(2) Ibid., p. 168.




Tópicos* A atuação do professor José Mário Pires Azanha como representante da Escola de Aplicação junto a Feusp no período de 1976 a 1984.
* As ideias do professor AZANHA sobre a escola pública, postas em prática na Escola de Aplicação da Feusp.


I - Textos introdutórios ao estudo do tema
(documentos: 4):
O significado de uma Escola de Aplicação para a FEUSP. AZANHA, J.M.P. (clique)
EA, 40 anos. Dezembro de 1999. Documento mimeografado.
Originalmente escrito em 1984.




Orientação geral do ensino de 1° grau (clique)
Capítulo do livro
AZANHA, J. M. P. Educação: alguns escritos. São Paulo: Ed. Nacional, 1987. p. 150-152.

Documento preparado pelo professor Azanha em 1976, na qualidade de representante da Direção da Faculdade de Educação junto à Escola de Aplicação da Universidade de São Paulo.



Alain ou a pedagogia da dificuldade (clique)
Artigo do periódico
Revista da Faculdade de Educação, v. 4, n. 1, p. 9-20, jun. 1978.

Também publicado em:
ALAIN. Reflexões sobre educação. São Paulo: Ed. Saraiva, 1978. p. VII-XIX. AZANHA, J. M. P. Educação: alguns escritos. São Paulo: Ed. Nacional, 1987. p. 44-57.



Plano Escolar Anual da Escola de Aplicação da Faculdade de Educação da USP. Relatora: GORDO, Nivia. (clique)
A Prof. Doutora Nivia Gordo foi responsável pela Coordenação Técnica da Escola de Aplicação da Feusp no período de 1976 a 1986, tendo acumulado a função de Diretora de 1983 a 1986. Mimeografado.




II - Documentos propostos para estudo
(documentos: 4)
Ensino de 2° Grau na Escola de Aplicação da FEUSP (clique)
Artigo de separata do periódico
Revista da Faculdade de Educação, v. 9, n. 1/2, p. 5-21, 1983.

Documento elaborado pelo professor Azanha na qualidade de presidente e relator da Comissão Especial constituída pela Direção da da FEUSP para implantação do ensino de 2° grau na Escola de Aplicação.
Também publicado em AZANHA, J. M. P. Educação: alguns escritos. São Paulo: Ed. Nacional, 1987. p. 153–164.


A Autonomia da Escola. AZANHA, J.M.P. (clique)
Jornal Educação Democrática N° 03/83.




A propósito de um debate sobre a Escola de Aplicação da FEUSP (clique)
Capítulo do livro
AZANHA, J. M. P. Educação: alguns escritos. São Paulo: Ed. Nacional, 1987. p. 165-170.

A polêmica sobre a Escola de Aplicação da FEUSP. GORDO, N. (clique)
Resenha intercalada dos acontecimentos de 1984 a respeito das divergências entre o Prof. Azanha e o Prof. Nelio Parra sobre o sentido da Escola de Aplicação da Feusp. A pedido do presente Acervo.




II - Documentos propostos para estudo
(documentos: 4)
III- Atos legais e relatórios administrativos
(documentos: 5)
Entrevista concedida à Profa. Dra. Izabel Galvão, Diretora da Escola de Aplicação da FEUSP. VÍDEO - PARTE 1/2. 1999. (clique)
Entrevista concedida pelo Prof. Dr. José Mário Pires Azanha para o corpo diretivo da Escola de Aplicação da FEUSP. Ele fala sobre a educação no Brasil e sobre as origens da Escola de Aplicação.




Entrevista concedida à Profa. Dra. Izabel Galvão, diretora da Escola de Aplicação da FEUSP. VÍDEO - PARTE 2/2. 1999. (clique)
Entrevista concedida pelo Prof. Dr. José Mário Pires Azanha para o corpo diretivo da Escola de Aplicação da FEUSP. Ele fala sobre a educação no Brasil e sobre as origens da Escola de Aplicação.




Escola de Aplicação da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo. Relatório de Atividades. 1981. (clique)
Relator: Nivia Gordo
In Estudos e Documentos. N° 18. São Paulo, 1981. p.7-46.




Regimento da escola de Aplicação da FEUSP. 1981. (clique)
In Documento Anexo ao Relatório de Atividades. 1981.








voltar à página acervo
 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

© 2014 - Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo ( direitos autorais)